sexta-feira, 30 de julho de 2010

Sonho de uma realidade perdida - Parte 4

Hoje trazemos a parte final da narrativa que criamos para divulgação no blog intitulada Sonho de uma realidade perdida. Caso você tenha perdido alguma das partes anteriores, você pode conferi-las nestes links: Parte 1, parte 2 e parte 3.

Em um grito agudo, Zyndal inclina o seu corpo para frente. Ao examinar as redondezas, logo percebeu que já não se encontrava mais no reino dos sonhos. Seu rosto, seu pijama e sua cama estavam encharcados em suor. Sua respiração estava ofegante, os olhos esbugalhados e o coração em disparada. Levantou-se lentamente e arrastou os pés até o banheiro. Escovou os dentes e encarou o reflexo no minúsculo espelho do banheiro por alguns minutos. Entrou no boxe do banheiro e perdeu a consciência, transformando suas rápidas chuveiradas num longo banho. Não preparou café nem vasculhou a geladeira e os armários atrás de algo para abocanhar. Estava sem apetite. Vestiu-se e partiu para o trabalho.

Caminhava lentamente para o escritório, ao contrário dos passos largos que sempre dava para chegar o quanto antes no escritório. Não estava com o olhar fixo e desprendido do resto mundo. Olhava atentamente para os lados o mundo ao seu redor. Os mendigos dormindo na calçada, as crianças, algumas pedindo esmola, outras trabalhando varrendo a rua, engraxando sapatos ou vendendo doces ou bugigangas. Uma outra se sentava escondida com um olhar hipnotizado. Drogada provavelmente. No escritório, o tempo parecia não passar. O monitor do computador brilhava e a mesa estava coberta de papéis. Zyndal não conseguia se concentrar no trabalho. A única coisa que conseguia pensar era no sonho e nas imagens que vira na rua. Tudo estava embaralhado em sua mente. Esforçava-se para juntar tudo o que tinha dentro dela, pois sentia que havia um significado maior em tudo aquilo. Permaneceu naquele estado meditativo até perceber que no relógio no canto do computador marcava o meio dia. Saiu silencioso, enquanto o seu supervisor olhava atravessado.

Ainda sem apetite, vagou pelo centro da cidade sem rumo. Parou na praça em frente à catedral. Sentou-se no primeiro banco vago que avistou, primeiramente cabisbaixo, em seguida fitando o cenário do parque. Seus olhos perambularam para os lados até terem passado por uma cena que chamou-lhe a atenção. No meio da praça, voluntários distribuíam alimentos e roupas para os menos afortunados. Muitas crianças rodeavam aquela parte do parque. Zyndal olhava fixamente para aquela direção. Era semelhante à cena do seu sonho, aquela que tanto o havia encantado. Mas aqui, havia algo diferente nela. Ela era real. No meio de tanta gente, sua visão volta-se para um menino de mãos dadas a uma velha senhora, se aproximando para receber donativos. Ao receber roupas, comida e um brinquedo, seus olhos brilharam. Eis que então, logo após aquela cena, os olhos de Zyndal também brilharam. Lentamente seu corpo se posiciona em pé, enquanto sua mente se deslumbre com a grande revelação. Memórias perdidas. Memórias que o tempo, o sofrimento a própria realidade em que se encontrava tornaram perdidas dentro da mente de Zyndal.

Recordava-se da infância. Nasceu numa família humilde. Os pais ainda eram jovens, e por desventura do destino também morreram jovens. Desde pequeno, ficou sobre os cuidados da avó. Ela sempre se mantinha esperançosa quanto ao futuro do pequeno Zyndal. Não o chamava por este nome, mas por um apelido: Zap. Chamou-o assim porque sempre procurava ensinar a ele sobre solidariedade e amor. Queria deixar uma mensagem especial para ele, a qual estava contida em seu apelido, pois Zap nada mais era do que Paz ao contrário. Infelizmente, a violência não poupou a pequena família que constituíam. Vítima de uma bala perdida, a avó havia deixado este mundo. Sem mais quem o cuidasse, Zyndal foi levado para longe favela onde morava, não só para outro lugar, mas para outra realidade. Continuou dedicando-se aos estudos, como a avó sempre pedia. Aos poucos, enquanto crescia, foi esquecendo do que viveu anteriormente e dos ensinamentos da avó. Alcançou o ensino superior e algum tempo depois uma vida estável. Cresceu, mas tornou-se frio.

Naquele instante, tudo fazia sentido. Aquele não foi, certamente, um sonho qualquer. Ele procurava trazer de volta para Zyndal à realidade que havia perdido. Aquela onde viveu parte da infância, assim como aquela que ainda existe atualmente, para a qual nunca tinha virado os olhos. Zyndal já não era mais a mesma pessoa que fora há um dia atrás. Estava transformado. Zyndal continuava olhando fixamente para a comoção no meio da praça. E ele sabia exatamente o queria da vida dali em diante.

O tempo não para, sendo que já fazia algum tempo desde aquela noite. Zyndal estava com agenda cheia. Caminhava a passos largos, com olhar fixo no horizonte, carregando a pasta com os bens utilizados no novo trabalho que fazia parte do seu cotidiano. Não gostava de chegar atrasado, afinal, haviam muitos esperando por ele. Logo se aproximou de um dos bairros mais pobres da cidade de onde viva. Foi avistado por várias crianças que gritavam pelo seu nome. Era a hora do dia de exercer o trabalho voluntário que sempre realizava nas mais diversas comunidades da região. Tornou-se um pioneiro no que fazia. Chegou até o local onde desempenhava suas atividades, recebendo a todos com um sorriso no rosto.

FIM

Postado por: Alisson Tres e Patrícia

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